A FAMÍLIA REAL SAIU PELA PORTA LATERAL e nós quatro, pelo mesmo lugar por onde tínhamos entrado, tudo sob as lentes das câmeras e as palmas dos convidados.
O olhar de Silvia assumiu um ar verdadeiramente assassino assim que cruzamos a porta. Ela parecia estar reunindo todas as forças para não me estrangular no caminho do corredor até uma saleta.
— Entrem — ela ordenou, como se estivesse a ponto de explodir.
Assim que entramos, Silvia nos deixou, batendo as portas.
— Você sempre tem que ser o centro das atenções? — atacou Elise.
— Não fiz nada além do que tentei convencê-las a fazer. Você foi a única que não acreditou em mim!
— Você age como se fosse santa. Eram criminosos. Não fizemos nada que um juiz não faria. A única diferença é que usávamos vestidos bonitos.
— Elise, você viu aqueles homens? Alguns estavam doentes. E as penas para seus crimes eram longas demais — argumentei.
— Ela tem razão — disse Kriss. — Prisão perpétua por roubo? A não ser que ele tivesse levado o palácio inteiro, o que teria feito para merecer isso?
— Nada — garanti. — Pegou roupas para a família. Vejam, vocês têm sorte. Nasceram em castas melhores. Quando uma família de casta inferior perde seu principal provedor… as coisas não ficam bem. Eu não poderia mandá-lo para prisão perpétua e, ao mesmo tempo, condenar sua mulher e seus filhos a virarem Oito. Não podia.
— Onde está seu orgulho, America? — Elise perguntou. — Onde está seu senso de dever, de honra? Você é apenas uma garota; nem é a princesa. E, se fosse, não teria permissão para tomar decisões assim. Teria que seguir as regras do rei. Só que você nunca faz isso! Desde a primeira noite aqui!
— Talvez as regras estejam erradas! — gritei, provavelmente no pior momento possível.
As portas se abriram com força. O rei Clarkson entrou de repente, enquanto a rainha Amberly e Maxon esperavam no corredor. Ele agarrou meu braço – felizmente não o ferido – e me arrastou para fora da sala.
— Para onde está me levando? — perguntei, já sem fôlego de tanto medo.
Ele não respondeu.
Virei a cabeça para trás e olhei para as garotas enquanto o rei me puxava. Celeste levou os braços aos ombros, como se quisesse proteção. Elise agarrou a mão de Kriss. Apesar de sua raiva, não ficou feliz ao me ver sair.
— Clarkson, não aja sem pensar — a rainha aconselhou em voz baixa.
Ao dobrarmos o corredor, o rei me forçou a entrar em uma sala. A rainha e Maxon vieram logo atrás, a tempo de ver o rei me atirar sobre um pequeno sofá.
— Sente-se — ordenou, apesar de não ser necessário.
Ele andava em círculos, como um leão enjaulado. Depois parou e encarou Maxon.
— Você jurou! — o rei urrou. — Você disse que ela estava sob controle. Primeiro, aquela loucura no Jornal Oficial; depois, quase causou sua morte no telhado. Agora isso? Isso acaba hoje, Maxon.
— Pai, o senhor ouviu os aplausos? As pessoas gostaram da compaixão que ela demonstrou. Ela é seu principal recurso no momento.
— Como é? — sua voz soou como um iceberg, lento e mortal.
Maxon fez uma pausa diante daquela frieza, mas continuou:
— O público reagiu positivamente quando ela aconselhou as pessoas a se defenderem. Ouso dizer que ela é o motivo de não termos mais mortos. E hoje? Pai, eu mesmo não poderia mandar para a prisão perpétua um homem que cometeu um crime insignificante. Como o senhor podia esperar isso de alguém que já viu vários amigos serem flagelados por muito menos? Ela é autêntica. A maioria da população pertence às castas inferiores, e por isso se identifica com ela.
O rei balançou a cabeça e voltou a caminhar.
— Deixei-a ficar porque ela o manteve interessado. Você é meu principal recurso, não ela. Se perdemos você, perdemos tudo. E não me refiro apenas à morte. Se você não estiver comprometido com esta vida, se perder o foco, tudo isto vai desmoronar — o rei disse, gesticulando para o espaço à sua volta. O silêncio tomou conta da sala. — Você está sofrendo uma lavagem cerebral! — acusou. — Você muda um pouco a cada dia. Essas garotas, esta mais do que as outras, são todas inúteis.
— Clarkson, talvez… — a rainha tentou opinar, em vão. O rei calou-a com apenas um olhar.
E então se voltou para Maxon.
— Tenho uma proposta para você.
— Não estou interessado — Maxon retrucou.
O rei Clarkson levantou os braços, para indicar que não oferecia ameaça.
— Escute primeiro.
Maxon soltou um suspiro.
— Essas garotas são um desastre. Mesmo os contatos da asiática não serviram para nada. A Dois só quer saber de fama, e a outra, bem, não é tão ruim, mas não é boa o suficiente se quer saber minha opinião. Esta — disse, com o dedo apontado para mim — perdeu qualquer valor que poderia ter por não saber se controlar. Tudo deu errado. E conheço você. Sei que teme perder alguma coisa, então escute o que eu tenho a dizer.
Apenas observei enquanto o rei rondava Maxon.
— Vamos cancelar tudo. Vamos nos livrar de todas essas garotas.
Maxon abriu a boca para protestar, mas o rei fez sinal para que se calasse.
— Minha intenção não é que você fique solteiro. Estou dizendo que ainda temos os registros de todas as garotas aptas no país. Não seria bom que você mesmo pudesse escolher um punhado de moças para virem ao palácio? Talvez encontre uma parecida com a filha do rei da França. Lembra-se de como gostava dela?
Baixei os olhos. Maxon nunca mencionara uma garota francesa.
Senti como se alguém tivesse usado um cinzel e um martelo para arrancar uma lasca do meu coração.
— Pai, não posso.
— Ah, pode. Você é o príncipe. E acho que já tivemos escândalos suficientes para saber que esse grupo não serve. Você poderia fazer a escolha de verdade dessa vez.
Ergui a cabeça. Maxon olhava para o chão. Seu conflito interior era evidente.
— Isso poderia até apaziguar os rebeldes por um tempo. Pense nisso! — acrescentou o rei. — Se enviarmos essas moças para casa, esperarmos uns meses e depois trouxermos um novo grupo de mulheres adoráveis, educadas, bonitas… Isso poderia mudar muita coisa.
Maxon tentou dizer algo, mas fechou a boca mais uma vez.
— Em todo caso, você devia se perguntar se essa aí — continuou, de novo apontando para mim — é alguém com quem deseja passar o resto da vida. Dramática, egoísta, gananciosa e, para ser bem honesto, muito simplória. Olhe para ela, filho.
Os olhos de Maxon cravaram-se nos meus. Sustentei o olhar por um segundo até não aguentar mais a humilhação.
— Você tem alguns dias. Por enquanto, é preciso lidar com a imprensa. Amberly.
A rainha acorreu a ele e tomou seu braço. Os dois saíram, nos deixando a sós e sem palavras.
Depois de uma breve pausa, Maxon me ajudou a levantar.
— Obrigada.
Ele apenas acenou com a cabeça.
— Acho que devo acompanhá-los. Sem dúvida também haverá perguntas para mim.
— Foi uma proposta bem interessante — comentei.
— Talvez a mais generosa que ele já fez.
Não quis saber se ele estava realmente cogitando a possibilidade. Como não havia mais nada a dizer, passei por ele e segui para o meu quarto, onde esperava superar tudo o que estava sentindo.
Minhas criadas avisaram que o jantar seria no quarto naquela noite. Como fui incapaz de falar com elas, as três fizeram o favor de sair. Deitei na cama, perdida em pensamentos.
Tinha feito a coisa certa, não tinha? Eu acreditava na justiça, mas a Condenação não era justiça. Ainda assim, me perguntava se tinha de fato conseguido alguma coisa com aquilo. Se aquele homem era de algum modo inimigo do rei – e eu precisava crer que era – então com certeza seria punido de outra maneira. Será que aquilo tudo não tinha servido para nada?
E, por mais insignificante que aquilo pudesse parecer diante de tudo que estava acontecendo, não conseguia parar de pensar na garota francesa. Por que Maxon nunca tinha falado sobre ela? Será que ela visitava muito o palácio? Por que ele a manteria em segredo?
Ouvi alguém bater à porta e pensei que fosse minha refeição, ainda que um pouco cedo demais.
— Pode entrar — eu disse, sem querer sair da cama.
A porta se abriu, e os cabelos escuros de Celeste apareceram.
— Está a fim de companhia? — perguntou. A cabeça de Kriss surgiu atrás dela e pude ver parte do braço de Elise, escondida no fundo.
— Claro — disse, me sentando.
Elas entraram, deixando a porta aberta. Celeste, ainda me causando certo choque toda vez que sorria sinceramente, subiu em minha cama sem nem pedir, mas não me incomodei. Kriss veio depois e sentou perto dos meus pés. Elise ficou na ponta, sempre uma dama.
Kriss perguntou baixinho o que todas queriam saber.
— Ele machucou você?
— Não — respondi, mas logo me lembrei de que não tinha sido bem assim. — Ele não me bateu nem nada. Só me puxou com força.
— O que ele disse? — Elise perguntou, mexendo em seu vestido.
— Não está feliz com a minha atuação. Se dependesse do rei, eu já estaria fora há um bom tempo.
Celeste segurou meu braço.
— Mas não depende. Maxon gosta de você, e o povo também.
— Não sei se isso basta. — Para qualquer uma de nós, completei mentalmente.
— Desculpe gritar com você — Elise disse baixinho. — É frustrante. Faço tanto esforço para ser calma e confiante, mas sinto que nada disso adianta. Vocês aparecem bem mais do que eu.
— Isso não é verdade — argumentou Kriss. — A esta altura, todas significamos alguma coisa para Maxon. Do contrário, não estaríamos aqui.
— Ele só está com medo de reduzir para as três finalistas — Elise rebateu. — Precisa fazer a escolha dentro de quanto tempo? Quatro dias? Ele só me mantém para adiar essa decisão.
— Quem disse que ele não pensa em se livrar de mim? — sugeriu Celeste.
— Ouçam — eu falei. — Depois de hoje, provavelmente serei a próxima a voltar para casa. Aconteceria cedo ou tarde. Não sirvo para isso.
Kriss achou graça.
— Nenhuma de nós é uma Amberly, não é?
— Eu gosto demais de chocar as pessoas — Celeste confessou com um sorriso.
— E eu prefiro me esconder a fazer metade das coisas que ela faz — Elise falou, baixando a cabeça.
— Eu sou impulsiva demais — admiti, dando de ombros.
— Nunca serei tão segura como ela — lamentou Kriss.
— Pois bem. Todas temos defeitos. Mas Maxon precisa escolher uma, então não há motivo para mais preocupação — Celeste declarou, brincando com o cobertor. — Pelo menos acho que concordamos que qualquer uma de vocês seria uma escolha melhor do que eu.
Depois de um silêncio carregado, Kriss se manifestou:
— O que você quer dizer?
Celeste olhou-a de canto.
— Você sabe. Todos sabem.
Ela respirou fundo antes de continuar.
— Eu meio que já tive essa conversa com America, e também falei com minhas criadas outro dia, mas nunca cheguei a me desculpar com vocês duas.
Kriss e Elise se entreolharam brevemente antes de focar de novo em Celeste.
— Kriss, eu arruinei sua festa de aniversário — confessou. — Você foi a única que pôde comemorar no palácio, e eu tirei aquele momento de você. Sinto tanto.
Kriss deu de ombros.
— No final deu tudo certo. Maxon e eu tivemos uma ótima conversa por sua causa. Já a perdoei faz tempo.
Celeste parecia a ponto de chorar, mas apertou os lábios e abriu um sorriso tenso.
— É muita generosidade, considerando que eu ainda não fui capaz de perdoar a mim mesma — ela falou, enquanto tocava os cílios. — É que eu não sabia como chamar a atenção dele, então roubei um pouco de você.
Kriss respirou fundo.
— Me senti péssima na hora, mas agora está tudo certo. Mesmo. Estou bem. Pelo menos não foi nada parecido com o que você fez para Anna.
Celeste fez uma careta de vergonha.
— Nem me lembre. Às vezes me pergunto até onde ela teria chegado se eu não tivesse… — ela chacoalhou a cabeça antes de olhar para Elise. — Não sei como você será capaz de perdoar tudo o que fiz contra você. Mesmo o que você não sabe que fui eu.
Elise, sempre equilibrada, não explodiu como eu teria feito em seu lugar.
— Você diz o vidro no meu sapato, as roupas arruinadas em meu armário e o cloro no xampu?
— Cloro?! — exclamei, e logo vi a confirmação no rosto cansado de Celeste.
Elise assentiu.
— Perdi uma manhã no Salão das Mulheres enquanto minhas criadas o tingiam de novo. — Depois, virou-se para Celeste. — Sabia que tinha sido você.
Celeste baixou a cabeça, completamente arrasada.
— Você não falava nem fazia nada. Para mim, era o alvo mais fácil. Fiquei impressionada por ter resistido.
— Jamais desonraria minha família com uma desistência — Elise falou.
Adorava sua convicção, embora não a compreendesse direito.
— Eles devem se sentir orgulhosos por tudo o que você enfrentou. Se meus pais descobrissem como me rebaixei… Nem sei o que diriam. Se os pais de Maxon descobrissem, com certeza eu já teria sido enxotada. Não nasci para isso — ela suspirou, com dificuldade em reconhecer.
Me aproximei e tomei sua mão.
— Acho que essa mudança prova o contrário, Celeste.
Ela levantou um pouco a cabeça e sorriu tristemente.
— Não faz diferença. Não acho que ele me queira. Mesmo se quisesse — ela acrescentou, soltando minha mão para consertar a maquiagem — alguém recentemente me lembrou de que não preciso de um homem para conquistar o que quero na vida.
Trocamos um sorriso antes de ela se virar mais uma vez para Elise.
— Nem sei por onde começar a pedir desculpas pelo que fiz contra você, mas queria que soubesse que me arrependo sinceramente. Sinto muito, Elise.
Elise permaneceu imóvel, com um olhar frio para ela. Me preparei para suas palavras venenosas agora que Celeste estava vulnerável.
— Eu poderia contar a ele. America e Kriss seriam minhas testemunhas. E Maxon teria que mandá-la para casa.
Celeste engoliu em seco. Como seria humilhante partir daquele jeito!
— Mas não vou — Elise disse afinal. — Nunca forçaria Maxon a nada. Quero perder ou ganhar com integridade. Então, vamos deixar isso para trás.
Não foi propriamente um perdão, mas foi mais do que Celeste esperava. Tudo o que ela conseguiu fazer sem desmoronar foi acenar com a cabeça e murmurar um agradecimento a Elise.
— Nossa — disse Kriss, na tentativa de mudar de assunto. — Eu também não ia dedurar você, Celeste, mas… nunca pensei que honra teria algo a ver com essa decisão — e olhou de novo para Elise enquanto refletia sobre aquilo.
— É o que sempre levo em conta — declarou Elise. — Preciso aguentar firme de qualquer jeito, principalmente porque serei uma vergonha para minha família se não vencer.
— Mas como podem culpar você se é ele quem faz a escolha? — Kriss perguntou enquanto se ajeitava na cama. — Por que isso envergonharia sua família?
Elise continuou sua explicação, revelando uma preocupação atrás da outra.
— Por causa da história dos casamentos arranjados. As melhores mulheres conseguem os melhores homens, e vice-versa. Maxon é o auge da perfeição. Minha derrota significaria que não sou boa o bastante. Minha família não vai levar em conta os sentimentos por trás da escolha dele, e acho que ele vai decidir seguindo justamente o que sente. Minha família vai pensar logicamente. Minha linhagem, meus talentos: fui criada para ser digna dos melhores. Então, se não for, quem vai me querer quando eu sair?
Eu já tinha pensado um milhão de vezes em como minha vida mudaria se perdesse ou ganhasse, mas nunca tinha levado em conta como isso afetaria os outros. Depois de toda aquela história com Celeste, eu realmente deveria ter pensado no assunto.
Kriss tocou a mão de Elise.
— Quase todas as meninas que voltaram para casa já estão noivas de homens maravilhosos. O simples fato de fazer parte da Seleção já transforma você em um prêmio. E você ainda chegou a ser uma das quatro finalistas da Elite. Confie em mim, Elise, os homens farão uma fila de dobrar o quarteirão atrás de você.
Elise achou graça.
— Não preciso de uma fila. Preciso de um só.
— Bom, eu preciso de uma fila — Celeste comentou e todas rimos, inclusive Elise.
— Eu gostaria de alguns — disse Kriss. — Uma fila parece um pouco assustadora.
As três olharam para mim.
— Só um.
— Você é louca — concluiu Celeste.
Conversamos um pouco sobre Maxon, sobre nossos lares, nossas famílias, nossas esperanças. Nunca havíamos conversado assim, sem barreiras entre nós. Kriss e eu tínhamos nos esforçado um pouco nesse sentido, tentando ser francas e honestas em relação à competição. Mas naquele momento podíamos falar da vida, e eu soube que nossa relação sobreviveria ao palácio.
Elise foi uma surpresa, mas o fato de sua perspectiva vir de um lugar tão diferente do meu me fez pensar mais, abrir a mente. E a maior revelação: Celeste. Se alguém me dissesse, no primeiro dia no aeroporto, que aquela morena de salto alto que caminhava de maneira tão intimidadora seria a garota que, no final, me deixaria mais contente de ter ao meu lado, eu teria gargalhado. A ideia era tão inacreditável como o fato de eu ainda estar ali, ser uma das últimas e sentir um aperto no coração diante da possibilidade real de perder Maxon.
À medida que a conversa avançava, ela passou a ser aceita pelas outras como já era por mim. Ela ficava de fato diferente sem o fardo de tantos segredos nas costas. Celeste tinha sido criada para ser linda de uma maneira específica, que dependia de esconder certas coisas, buscar o melhor ângulo e a perfeição o tempo inteiro. Havia, porém, outro tipo de beleza, que vinha com a humildade e a honestidade, e era essa beleza que ela irradiava naquele momento.
Maxon devia ter chegado bem de mansinho, pois eu não tinha ideia de há quanto tempo ele estava parado na porta, nos observando. Elise foi a primeira a ver sua silhueta no canto do quarto e logo se endireitou.
— Alteza — saudou, inclinando a cabeça.
Todas olhamos na mesma direção, na certeza de que não tínhamos ouvido bem.
— Senhoritas — ele disse, acenando a cabeça para nós. — Não tive intenção de interromper. Acho que acabei de estragar algo.
Nos entreolhamos, e tive certeza de que não era a única a pensar: Não, você fez uma coisa maravilhosa acontecer.
— Sem problemas — eu disse.
— Mais uma vez, sinto muito por interromper, mas preciso falar com America. A sós.
Celeste deixou escapar um suspiro e começou a se mexer, piscando para mim antes de levantar. Elise ergueu-se rapidamente, e Kriss fez o mesmo, afagando levemente minha perna ao sair da cama. Elise fez uma reverência ao passar por Maxon, enquanto Kriss parou para arrumar sua lapela. Celeste se aproximou mais firme do que nunca e cochichou algo no ouvido dele.
Quando ela terminou, o príncipe sorriu.
— Não acho que vai ser preciso — foi sua resposta.
— Ótimo.
Celeste saiu e fechou a porta. Permaneci imóvel, me preparando para o que viria.
— O que foi isso? — perguntei, apontando a cabeça para a porta.
— Ah, Celeste quis deixar claro que, se eu machucar você, ela vai me fazer chorar — Maxon respondeu com um sorriso.
Achei graça.
— Já provei daquelas unhas, então tome cuidado.
— Sim, senhora.
Respirei fundo. Meu sorriso se desfez.
— Então?
— Então?
— Você vai aceitar?
Maxon abriu um sorriso e balançou a cabeça, negando.
— Não. Foi uma ideia intrigante por alguns segundos, mas não quero recomeçar. Gosto das minhas garotas imperfeitas.
Ele deu de ombros, aparentemente satisfeito.
— Além disso — continuou —, meu pai não conhece August nem os objetivos dos rebeldes do norte nem nada disso. Suas decisões são precipitadas. Abandonar o barco agora seria não enxergar o que temos adiante.
Respirei aliviada. Tinha esperança de que Maxon se preocupasse comigo o suficiente para não me deixar sair. No entanto, depois da conversa com as garotas, também não queria que elas fossem embora.
— Além disso — ele acrescentou, com ar de felicidade — você tinha que ter visto a imprensa.
— Por quê? O que houve?
— Mais uma vez ficaram impressionados com você. Nem mesmo eu entendo bem o clima do país agora. É como se... é como se eles soubessem que as coisas poderiam ser diferentes. Ele governa este país do mesmo jeito que me governa. Acha que só ele é capaz de tomar as decisões certas, por isso obriga os outros a seguirem suas ordens. E, depois de ler os diários de Gregory, parece que as coisas são assim há muito tempo.
Maxon sacudiu a cabeça.
— Mas ninguém mais quer isso. As pessoas querem uma escolha. Você o deixa aterrorizado, mas ele não pode expulsá-la. O povo adora você, America.
Engoli sem seco.
— Adora?
Ele assentiu.
— E… eu sinto algo parecido. Então não importa o que ele diga ou faça, não se desespere. Ainda não acabou.
Levei a mão à boca, espantada com as notícias. A Seleção continuaria, as outras garotas e eu ainda teríamos nossa chance e, de acordo com Maxon, as pessoas gostavam cada vez mais de mim.
Apesar das boas notícias, porém, uma coisa ainda me incomodava.
Olhei para o cobertor, quase com medo de perguntar.
— Sei que vai parecer idiota… mas quem é a filha do rei da França?
Maxon se calou por alguns instantes e depois sentou na cama.
— O nome dela é Daphne. Antes da Seleção, foi a única garota que conheci de verdade.
— E?
Ele abafou o riso.
— E depois descobri que o que ela sentia por mim ia além da amizade, mas não correspondi. Não pude.
— Havia algo de errado com ela ou…
Maxon segurou minha mão e me fez olhar para ele.
— America, não. Daphne é minha amiga. Nunca passará disso. Passei a vida à sua espera, à espera de todas vocês. Esta era minha chance de encontrar uma esposa, e sei disso desde que me entendo por gente. No quesito romance, meu vínculo com Daphne é zero. Nunca sequer pensei em mencioná-la a você, e com certeza meu pai falou dela com o único objetivo de fazê-la duvidar de si mesma outra vez.
Mordi os lábios. O rei conhecia minhas fraquezas muito bem.
— Vejo você fazer isso o tempo todo, America. Compara-se com a minha mãe, com as outras da Elite, com uma versão de si mesma que julga ser melhor, e agora está quase fazendo o mesmo com uma pessoa cuja existência você ignorava poucas horas atrás.
Era verdade. Eu já imaginava se ela era mais bonita do que eu, mais inteligente, ou se pronunciava o nome de Maxon com um sotaque sedutor.
— America — ele disse, com as mãos em minhas bochechas —, se ela tivesse sido importante, eu teria contado. Assim como você faria comigo.
Meu estômago se contorceu. Eu não tinha sido completamente honesta com Maxon. Mas, com ele ali olhando para mim daquele jeito, tão fixamente, era fácil deixar tudo aquilo de lado. Eu conseguia esquecer tudo ao nosso redor quando ele me olhava daquele jeito.
Então me joguei em seus braços e o apertei bem forte. Não queria estar em nenhum outro lugar do mundo.
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