segunda-feira, 11 de agosto de 2014

26° Capitulo - A Escolha

PASSEI O RESTO DO DIA ESCONDIDA NO QUARTO. Não queria ver o rosto acusador de Kota nem lidar com as perguntas de minha mãe. O pior era Lucy. Ela parecia tão triste por eu ter guardado aquele segredo dela. Eu nem queria que me servisse, e ela parecia satisfeita em ajudar minha mãe como podia ou brincar com May.
De qualquer forma, eu tinha muito em que pensar, então era melhor não tê-la por perto. Não parava de ensaiar o que diria para Maxon. Tentei imaginar um modo de contar que não fosse tão ruim. Omitiria o que Aspen e eu tínhamos feito no palácio? Se sim, e Maxon perguntasse sobre isso, seria pior do que admitir logo no início?
Então me distraí pensando em meu pai, imaginando o que ele teria dito ou feito ao longo dos anos. Será que todas aquelas pessoas que eu não conhecia em seu funeral eram rebeldes mesmo? Seriam tantos assim? Será que eu deveria contar isso a Maxon? Será que ele ainda ia me querer se soubesse que minha família tinha ligações com os rebeldes? Aparentemente, as outras da Elite estavam lá por causa dos seus contatos. E se os meus contatos fossem motivo para eu ser desligada? Pouco provável, já que estávamos tão próximos de August, mas ainda assim…
Comecei a pensar no que Maxon estaria fazendo. Trabalhando, talvez. Ou arranjando um jeito de escapar do trabalho. Eu não estava lá para passear ou conversar com ele. Fiquei imaginando se Kriss teria tomado meu lugar.
Cobri os olhos e tentei pensar. Como enfrentaria tudo aquilo?
Então alguém bateu na porta. Não sabia se o visitante melhoraria ou pioraria as coisas, mas pedi que entrasse mesmo assim.
Era Kenna. Pela primeira vez desde a minha chegada, estava sem Astra.
— Você está bem?
Sacudi a cabeça e comecei a chorar. Ela se aproximou e sentou ao meu lado na cama, passando o braço pelas minhas costas.
— Sinto saudades do papai. A carta dele foi tão…
— Eu sei — ela disse. — Ele quase nunca falava quando estava aqui. E escreveu todas aquelas palavras. Por um lado, fico feliz; não sei se me lembraria de tudo aquilo se ele não tivesse escrito.
— Sim.
As palavras de Kenna me deram a resposta para a pergunta que eu temia fazer. Ninguém mais sabia que nosso pai tinha sido um rebelde.
— Então… você e Aspen?
— Acabou, eu juro.
— Acredito em você. Você devia ver o jeito que olha para ele quando aparece na TV. Nem aquela outra… Celeste? — ela falou com uma cara de nojo.
Abri um sorriso.
— Ela tenta fingir que está apaixonada por ele, mas dá para ver que não é verdade. Pelo menos, não tão verdade quanto ela gostaria.
Dei risada.
— Você não faz ideia de como está certa.
— Queria saber quanto tempo durou. Digo, entre você e Aspen.
— Dois anos. Começamos depois de você casar e Kota sair de casa. Nos encontrávamos na casa da árvore uma vez por semana. Estávamos juntando dinheiro para casar.
— Você estava apaixonada?
Eu não deveria ser capaz de responder aquela pergunta sem hesitar? Não deveria ser capaz de dizer que com certeza tinha amado Aspen? Mas agora não parecia tão fácil. Talvez estivesse apaixonada na época, mas o tempo e a distância faziam tudo parecer diferente.
— Acho que sim, mas não era…
— Não era como é com Maxon? — ela especulou.
Balancei a cabeça.
— É tão estranho agora. Por muito tempo, Aspen era a única pessoa com quem eu conseguia me imaginar. Estava pronta para ser Seis. E agora?
— Agora você está prestes a se tornar a próxima princesa. — Seu tom de voz monótono fez a situação parecer mais engraçada.
Rimos juntas da minha mudança drástica de vida.
— Obrigada.
— Para que servem as irmãs, afinal?
Olhei para ela e senti que de alguma forma aquilo a fazia sofrer.
— Desculpe não ter contado antes.
— Você me contou agora.
— Não era por falta de confiança em você. Acho que o segredo deixava toda a relação mais especial.
Dizer aquelas palavras em voz alta me fez perceber que era verdade. Sim, eu tinha carinho por ele. Só que as coisas ao nosso redor deixavam o namoro mais gostoso: o segredo, as carícias apressadas, o fato de termos um ideal pelo qual valia a pena batalhar.
— Eu entendo, America. De verdade. Só espero que você nunca tenha sentido queprecisava guardar esse segredo, porque eu sempre estive ao seu lado.
Respirei aliviada e algumas preocupações pareceram diminuir. Pelo menos por um instante. Deitei a cabeça no ombro de Kenna. Era bom ser capaz de pensar.
— E então, Aspen ainda sente algo por você?
Soltei um suspiro e endireitei o corpo.
— Ele vive tentando me dizer como sempre me amou. E eu sei que deveria dizer a ele que acabou, que amo Maxon, mas…
— Mas?
— E se Maxon escolher outra? Não posso sair de lá sozinha. Se Aspen achar que ainda há chance, talvez pudéssemos tentar de novo quando a Seleção acabar.
Ela me encarou, indignada.
— Você está usando Aspen como plano B?
Enterrei a cabeça nas mãos.
— Eu sei, eu sei. É horrível, não é?
— America, você é melhor do que isso. E se algum dia já gostou dele, Aspen tem tanto direito de saber a verdade quanto Maxon.
Foi quando outra pessoa bateu na porta.
— Entre.
Corei um pouco ao ver Aspen entrar, seguido por Lucy, que ainda estava desanimada.
— Você precisa se vestir e fazer as malas — ele avisou.
— Há algo errado? — Levantei, já tensa.
— Só sei que Maxon quer você de volta ao palácio imediatamente.
Respirei fundo; estava confusa. Era para eu ter mais um dia. Kenna me deu um abraço forte antes de voltar para a sala de estar. Aspen saiu, e Lucy simplesmente pegou seu uniforme e foi se trocar no banheiro, fechando a porta atrás dela.
Mais uma vez sozinha, repassei tudo na cabeça. Kenna tinha razão. Eu já sabia o que sentia por Maxon, e era hora de fazer o que meu pai pedira, o que eu deveria ter feito desde o início: lutar.
Como a tarefa mais difícil seria falar com Maxon, achei melhor começar por ela. Depois que tivesse resolvido isso, não importava o resultado, pensaria no que dizer a Aspen.
Tudo tinha acontecido tão devagar que demorei para perceber como nossa relação tinha mudado. Só que fazia semanas que eu já sabia o que queria e não tinha dito nada a ninguém. Precisava fazer a coisa certa e falar com ele. Tinha que abrir mão de Aspen.
Fui até a minha mala em busca do embrulho embaixo das roupas. Assim que o encontrei, desfiz o invólucro de tecido e tirei meu jarro. A moedinha estava lá com a pulseira, mas não importava.
Pus o jarro no parapeito da janela, no lugar onde deveria ter ficado muito tempo atrás.


Passei a maior parte do voo ensaiando minha conversa com Maxon. Lamentava aquilo, mas só conseguiríamos seguir em frente se ele soubesse a verdade.
Do meu assento, olhei para a parte traseira do avião. Aspen e Lucy estavam virados para a frente, lado a lado, em poltronas separadas pelo corredor. Conversavam seriamente. Lucy ainda parecia chateada e acho que estava dando orientações. Ele permanecia calado, apenas concordando com as sugestões da minha criada. Mais tarde, quando ela se endireitou no assento e Aspen se levantou, voltei a olhar para a frente, torcendo para não ter sido flagrada.
Tentei fingir que estava muito interessada em meu livro quando ele se aproximou.
— O piloto informa que temos mais ou menos meia hora pela frente — Aspen me avisou.
— Ótimo, sem problemas.
Ele hesitou.
— Desculpe a história com Kota.
— Você não precisa pedir desculpas. Ele é que é mesquinho.
— Preciso, sim. Há uns anos, ele me provocou dizendo que eu tinha uma queda por você. Desconversei, mas acho que ele notou. E deve ter ficado de olho desde então. Eu deveria ter sido mais cuidadoso, sei lá, deveria…
— Aspen.
— O quê?
— Vai dar tudo certo. Vou contar a verdade a Maxon e assumir a responsabilidade. Você tem pessoas em casa que dependem de você. Se algo acontecer…
— Meri, você tentou evitar, e eu teimei em não ouvir. A culpa é minha.
— Não, não é.
Ele respirou fundo.
— Ouça… preciso falar uma coisa. Sei que vai ser difícil, mas você precisa saber. Quando disse que sempre amaria você, estava falando sério. E eu…
— Pare — pedi.
Eu sabia que precisava contar a verdade, mas só dava conta de uma confissão por vez.
— Não vou aguentar isso agora. Meu mundo acabou de virar de ponta-cabeça; estou prestes a fazer uma coisa que me deixa apavorada. Preciso de espaço para respirar no momento.
Aspen não pareceu feliz com a minha decisão, mas aceitou mesmo assim.
— Como quiser, senhorita.
Ele se retirou, e fiquei me sentindo ainda pior do que já estava.

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