O JÚRI ERA UMA DAS PECULIARIDADES de Culver Creek. Todo semestre, o corpo docente selecionava doze alunos, três de cada ano para servirem de jurados. Eles deliberavam o castigo para os delitos menores, não puníveis com expulsão, desde sair depois do toque de recolher até fumar. Os mais comuns eram fumar e ser pego no quarto de uma menina depois das sete horas. A pessoa se apresentava diante dos jurados, fazia sua defesa e eles davam a sentença. O Águia servia de juiz e tinha o direito de invalidar as decisões do júri (exatamente como nos tribunais norte- americanos), mas quase nunca o fazia. Fui para a Sala 4 logo depois da última aula - quarenta minutos adiantado, só para garantir. Sentei-me no corredor com as costas grudadas na parede e fiquei lendo o livro de história norte-americana (uma espécie de leitura terapêutica para mim, para ser sincero) até que Alasca apareceu e se sentou ao meu lado. Ela estava mordiscando o lábio inferior, então lhe perguntei se estava nervosa. "Bem, estou. Mas aguente firme e não diga nada, está bem?" advertiu. "Você não precisa ficar nervoso. Mas esta é a sétima vez que sou pega
fumando. Não quero - que seja. Não quero chatear meu pai." "Por quê? Sua mãe fuma?", perguntei. "Parou de fumar, disse Alasca. "Está tudo bem. Você vai ficar bem." Só comecei a me preocupar quando deram 16h50 e não havia sinal nem do Coronel nem do Takumi. Os membros do Júri fizeram fila para entrar na sala, passando por nós sem fazer contato visual - o que me fez sentir pior ainda. Lá pelas 16h56, todos os doze já tinham chegado, inclusive o Águia. Às 16h58, o Coronel e o Takumi dobraram a esquina a caminho das salas de aula. Eu nunca tinha visto nada parecido. Takumi usava uma camisa branca engomada e uma gravata vermelha com estampa preta; e o Coronel estava com sua camisa cor-de-rosa amassada e a gravata com desenhos de flamingos. Ambos caminhavam no mesmo passo, queixo para cima, ombros para trás, como se fossem heróis de algum filme de ação. Ouvi Alasca suspirar: "O Coronel está fazendo sua Caminhada de Napoleão." "Está tudo bem, o Coronel me disse. "Só não diga nada." Entramos - dois de nós usando gravatas e os outros dois usando camisetas velhas -, e o Águia deu uma firmíssima martelada no atril. Os jurados estavam sentados atrás de uma mesa retangular. Na frente da sala, perto da lousa, havia quatro cadeiras. Nós nos sentamos, e o Coronel explicou exatamente o que havia acontecido. "Alasca e eu estávamos fumando perto do lago. Geralmente saímos do campus para fumar, mas dessa vez esquecemos. Sentimos muito. Não vai se repetir." Eu não sabia o que estava acontecendo. Mas sabia o que devia fazer: aguentar firme e não dizer nada. Um dos garotos se virou para o Takumi e perguntou: "E quanto a você e o Halter?" "Estávamos apenas fazendo companhia", Takumi disse, calmamente. O garoto se virou para o Águia e perguntou: "O senhor viu alguém fumando?" "Só Alasca, mas Chip saiu correndo, o que me pareceu uma covardia, assim como esse arzinho de espanto do Miles e do Takumi", disse o Águia, lançando-me o Olhar do Juízo Final. Eu não queria parecer culpado, mas não
consegui sustentar seu olhar, então baixei a cabeça e fitei minhas mãos. O Coronel trincou os dentes, como se lhe custasse mentir. "É a verdade, senhor." O Águia nos perguntou se queríamos dizer mais alguma coisa, perguntou ao Júri se eles tinham mais perguntas e nos mandou sair. "Que diabos aconteceu lá dentro?, perguntei ao Takumi quando saímos. "Aguenta firme, Gordo." Por que Alasca tivera de confessar? Logo ela que fora pega tantas vezes! Por que o Coronel, que, literalmente, não podia se dar ao luxo de se meter em encrenca? Por que não eu? Eu nunca tinha sido pego por nada. Eu tinha menos a perder. Passados alguns minutos, o Águia apareceu e fez sinal para que entrássemos. "Alasca e Chip", disse um dos membros do Júri, "vocês serão punidos com dez horas de trabalho forçado - lavando pratos no restaurante da escola -, e, se acontecer mais alguma coisa, seus pais serão notificados. Takumi e Miles, não há nada no regulamento que os proíba de ficar vendo alguém fumar, mas o Júri vai se lembrar dessa história se vocês violarem mais alguma regra. Entendidos?" "Entendidos", disse Alasca depressa, visivelmente aliviada. Quando eu estava saindo, o Águia me puxou pelo ombro. "Não abuse dos seus privilégios nesta escola, rapazinho, ou vai se arrepender". Eu assenti com a cabeça.
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