sexta-feira, 4 de julho de 2014

12° Capitulo - A Garota da Capa Vermenha

Dentro da montanha, a tagarelice que havia acontecido na taberna cedera lugar a um silêncio ansioso.
— Por aqui, homens — Henry ouviu o oficial de justiça sussurrar quando chegaram à bifurcação, apontando para um túnel que conduzia a um antro de escuridão.
O oficial de justiça virara-se para encarar a turba de seguidores, com Peter e Henry firmes de cada lado como suportes. Mesmo com a luz emitida pelas tochas, os rostos dos homens pareciam nublados nas trevas da caverna, o ar parecia coagulado, espesso e amargo.
— Não é seguro — resmungou um trabalhador do curtume, sem muita convicção. — Não dá para ver o que há além da curva.
— Vamos tomar o outro caminho — Peter afirmou, apontando para a sua metade do grupo.
Henry olhou para o pai. Eles não queriam admitir, mas Peter estava certo. Um grupo de vinte homens era grande demais para ser manobrado na caverna escura. Henry desejou ter falado primeiro.
— Sim — ele falou, só para acrescentar alguma coisa. — acho que a gente deveria se separar.
— Como você quiser — o Oficial de justiça declarou, arrogante, seguindo sozinho enquanto os outros homens ponderavam as opções, escolhendo seus lados.
Alguns, contentes com a liderança do oficial de justiça, decidiram segui-lo. Peter, Henry e Adrien, aqueles que queriam liderar em vez de serem liderados, foram embaraçosamente deixados por si. Pelo menos dessa maneira, Henry poderia manter uma estreita vigilância sobre Peter.
Ele desejava que seu pai deixasse tudo sob sua responsabilidade, mas Adrien, vendo o grupo reunido, assumiu o controle. Os lenhadores estavam com eles, permanecendo como carrapichos – iriam aonde Peter fosse. Cesaire, deixado para trás enquanto tomava um último gole enervante de seu frasco encapado em couro, decidiu, com hesitação, que seguiria o grupo do oficial de justiça e correu para alcançá-lo.
Agora por conta própria, Adrien, Henry, Peter e os lenhadores seguiram em frente. Os lenhadores tentaram manter seus passos leves, mas eram grandes e rudes e não estavam acostumados a andar na ponta dos pés.
Henry juntou-se a Peter, assustando-o.
— É possível que fique perigoso aqui embaixo — ele acendeu um galho. — É melhor você tomar cuidado.
— Tome cuidado você — Peter respondeu, apontando para a chama que havia devorado seu caminho ao longo do comprimento do galho. A ameaça do seu olhar era evidente até mesmo na escuridão.
— Certo — Henry assentiu, sacudindo a mão quando a chama a atingiu.
Antes que a rivalidade pudesse se intensificar, o grupo chegou a mais uma bifurcação. Um caminho era mais ameaçador que o outro, todos escuros como breu.
— Precisamos vasculhar cada canto. — Peter fez sinais para os lenhadores se separarem novamente. — Nós vamos tomar o caminho mais íngreme.
— Não — Henry interrompeu, ansioso por discordar e para evitar que Peter tomasse mais uma decisão por eles — devemos ficar juntos agora.
— Talvez você devesse ir para casa e esperar o padre Solomon — disse Peter olhando para trás, já a caminho do trajeto em declive.
Com as palavras conflitantes dos rapazes, os lenhadores trocaram olhares. Será que eles queriam confiar suas vidas a um jovem rapaz arrogante? Olharam atrás para as silhuetas de Henry e Adrien na parte superior, sozinhos, indecisos, e seguiram Peter mesmo hesitando. Observando-os, Henry sentiu os olhos de seu pai sobre ele. “Por que não fui eu quem sugeriu isso?”



Peter sorriu para si mesmo, satisfeito por ter ganhado. Seu grupo se manteve logo atrás dele; a luz de sua tocha percorria as paredes e o solo para detectar qualquer sinal de movimento.
Avançando por uma passagem mais estreita, os lenhadores ficaram com medo, colocando um pé cauteloso na frente do outro, esperando o Lobo saltar sobre eles, aguardando cair na escuridão da morte. Uma brisa suave soprou; um mal inquieto parecia sussurrar através da escuridão.
Alguns momentos depois, um lenhador, assustado por uma enorme rocha saliente, deixou cair seu arco, o que fez ecoar um ruído metálico por todos os túneis. Os homens foram tomados por um medo irracional, mas, felizmente, Peter pensava por eles. “Ande”, ele pensou. “Aguarde a mudança do ar, para sentir aquele momento de calma que antecede um movimento a ser feito”.
O ar mudou em um instante esmagador; uma rajada forte de vento afligiu a caverna, transportando do nada ele e seus homens para o caos.



Henry, longe dali, viu as paredes desaparecem em um casulo de escuridão e foi tomado pelo pânico quando o vendaval as atingiu, agitando pedaços de terra e jogando areia em seus olhos.
Tudo que ouviu foram gritos agudos e altos. Pés corriam.
Sua tocha se apagou.



O oficial de justiça a viu primeiro. Aquela mancha triangular, o semicírculo de quatro manchas redondas e – o pior de tudo – os quatro minúsculos pontos acima e a impressão sangrenta do Lobo estampada na terra iluminada pela tocha do oficial de justiça. Curvou-se sobre o chão; seus homens se reuniam ao seu redor quando, de algum lugar mais profundo da caverna, ele ouviu um grito distante.
Um homem havia sido atacado.
O oficial de justiça estava pronto para isso; sabia exatamente de onde o som agudo viera desde seu primeiro tom.
— Corram! — gritou.
A maioria dos homens obedeceu, mas alguns poucos se dispersaram, correndo para longe do grito e dirigindo-se para a boca da caverna. Seus gritos ecoavam por toda a montanha.
“Vamos descer pelo túnel, cada vez mais”, o oficial de justiça se ordenava. “Agora está longe demais para a bifurcação ser a passagem mais próxima. Deve haver outra maneira. O terreno não é bom aqui; a lama é muito solta. Cuidado para não escorregar. Não tropece nas rochas das margens.”
Sua respiração estava acelerada e seus passos ressoavam mais alto. “Há alguma luz. Corra para a luz, talvez haja alguma coisa lá”. Ele podia vê-la agora. “Uma abertura, uma câmara, à frente!”
O oficial de justiça tropeçou no espaço; seus homens estavam espalhados atrás dele. A neve, tingida de vermelho pelo luar, rodopiava a partir de uma fenda nas rochas lá no alto. Esquadrinhando o perímetro do lugar, seu olhar pousou sobre formas torcidas e gigantescas.
Formações rochosas?
Aproximando-se e mantendo um olho atento para o movimento, ele foi até elas. E viu que não eram pedras.
Ossos, ossos humanos. Empilhados até uns três metros. Eram tão intensamente brancos que pareciam quase pintados, O oficial de justiça estava diante da torre, sentindo-se castigado.
Olhou para cima. Onde estava o Lobo? Ele não poderia ter saído... Os olhos vazios dos crânios o encaravam, com suas bocas esticadas em sorrisos, zombando de sua situação, mas sem oferecer respostas.
Examinando a sala... ele se deparou com outra coisa. Adrien. Seu corpo estava frio e sem vida, rasgado horrivelmente pelo Lobo.
Algo se levantou no peito do oficial de justiça. Sentiu o silêncio atordoado dos homens atrás de si. Encontraria o Lobo e o faria pagar. Em uma onda de agressividade, ele agora não pisava com cuidado. Deleitava-se em ocupar espaço, em andar com passos pesados, que ecoavam. Ele iria encontrá-lo.
Ocupado em imaginar a grandiosidade de sua futura glória, o oficial de justiça ouviu um barulho atrás dele. Um rosnado baixo.
Ele se virou e viu-se cara a cara com uma boca cheia de dentes furiosos. Saliva acumulando nos cantos. Caninos enormes e brilhantes.
Sem saber como isso acontecera, o oficial de justiça viu a própria adaga na sua mão à frente. O pelo no pescoço do animal se eriçou, e a baba nociva de sua boca horrível pingava em grande quantidade no chão da caverna. Seus olhos se encontraram. O tempo parou. Então o monstro saltou, formando um arco na direção de sua próxima vitima.

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